O artigo "Presídio não pode ter nome de gente" é de autoria do presidente da Seccional da OAB de Mato Grosso do Sul (OAB-MS), Fábio Trad e foi publicado no site da entidade (Fábio Trad):
"Os presídios brasileiros são verdadeiras senzalas modernas que nos recordam os mais deprimentes tempos da nossa história. Em sua grande maioria, as prisões do Brasil são sujas, fétidas, podres, insalubres, escuras, superlotadas e absolutamente incompatíveis com a dignidade da pessoa humana. Enfim, o sistema prisional brasileiro é um claro exemplo de violação dos direitos humanos. Um verdadeiro terror.
Também é fato que todos sabem que o problema da prisão é a própria prisão: não regenera, não recupera, não reenquadra, não ressocializa, não melhora, não inibe, não intimida, enfim, é uma destas provisórias soluções da humanidade que só existem porque não há outra menos pior.Os juristas dizem que a prisão é um mal, porém um mal necessário.
O Conselho Nacional de Justiça realizou uma pesquisa de abrangência nacional e constatou que 50% da população carcerária deveria estar livre, seja porque há excesso de tempo de cumprimento de pena e prisões provisórias, seja porque muitas prisões foram desnecessariamente decretadas.
Nas prisões do Brasil, todos sabem, predominam a violência física, moral, sexual e psicológica, abusos de autoridade, corrupção moral e econômica, a banditização forçada, extorsões, favorecimentos espúrios, privilégios indevidos, favores ilícitos, torturas, celas solitárias, tráfico de drogas, prostituição, doenças graves e incuráveis, assassinatos, suicídios, dor, vergonha e sofrimento, muito sofrimento. É um milagre a recuperação do preso brasileiro.
Ora, se desde a sua institucionalização, o sistema carcerário brasileiro, ao longo de toda a sua história, sempre se notabilizou como sendo o mais eficaz e eficiente deformador da personalidade humana (prisonização cultural, dizem os criminólogos), por qual razão se insiste em alimentar o costume de "homenagear"pessoas emprestando os seus nomes a estes infernos de cncreto armado chamados penitenciárias?
Uma homenagem se faz a quem se respeita pela história de sua vida e dedicação ao próximo. O ser humano aspira ser lembrado por quem conheceu suas virtudes, associando o seu nome aos bons valores da vida: a paz, o trabalho, a liberdade, a solidariedade, o perdão, a coragem, a caridade e o amor.
Fico pensando no terrível constrangimento que o Poder Público causa, ainda que involuntariamente, à família e aos amigos dos "homenageados" ao estampar o nome de seus entes queridos em um local que, com exceção dos hipócritas, todos sabem que servirá de palco para tudo aquilo que, durante a vida inteira, foi combatido pelo falecido.
Que constrangimento à família do Dr. Harry Amorim Costa, homem que lutou pelo estado e ficou conhecido pela honradez e dignidade, ao ser eternizado com a lembrança de seu nome a um presídio dominado por organizações criminosas !
E o saudoso Jair Ferreira de Carvalho, morto brutalmente pela violência daqueles que, certamente, planejaram a sua morte no mesmo lugar onde hoje se empresta o seu nome?
Foi por estas razões que tanto o meu professor Antônio Evaristo de Moraes Filho e o imortal Evandro Lins e Silva pediam, insistentemente, aos seus amigos e familiares que não permitissem a conspurcação de suas memórias através da "homenagem"de serem nomes de presídios.
Quanta ingratidão com Anibal Bruno, Nelson Hungria, Heleno Fragoso, Everardo da Cunha Luna, Irmã Zorzi, enfim, uma série de personalidades que sempre pregaram a paz e a liberdade, hoje presos ao cimento frio de pocilgas que exalam o odor do opróbrio e da ignomínia.
Se fosse dada a oportunidade a todos estes "homenageados" de se manifestarem a respeito da concessão deste "prêmio", certamente, que, diram um rotundo NÃO, ainda que psicografado, aos políticos que pensassem em eternizá-los desta maneira.
Presídio com nome de gente é o mesmo que dar nome de santo a boate. É um absurdo. Imaginem: Casa noturna e Boate Nossa Senhora da Aparecida ? Um absurdo inominável, uma violência, uma demonstração de burrice e deselegância que chega a arrepiar o espírito.
Por isso, sugiro à bancada parlamentar da advocacia da Assembléia Legislativa de MS que se mobilize para proibir esta prática injustificável de se dar nome de gente boa a um local que só conhece violência e sofrimento.
Sugiro a seguinte forma de reparação: Escola Harry Amorim Costa, Praça Irmã Zorzi, Casa de Saúde Jair Ferreira de Carvalho ...
E os presídios? Sugiro que aos presídios não sejam emprestados nomes de pessoas, mas apenas a razão de ser: Instituto Penal de Segurança Máxima ou Presídio de Trânsito... apenas isso. Só isso!
Enquanto não se muda esta suprema indelicadeza com a biografia dos "homenageados", oremos para que o milagre da ressocialização seja menos raro.
domingo, 18 de outubro de 2009
O HOMEM PRESO A HISTÓRIA
Por: Elizabeth Misciasci“Na Antiguidade”
Os cativeiros existiam desde 1700 a.C-1.280 a.C. para que os egípcios, pudessem manter sob custódia seus escravos.
Por volta de 525 a.C., os lavradores eram requisitados para construí as obras públicas e cultivar as terras do faraó, proprietário de toda a terra do Egito e toda a riqueza, repousava no trabalho dos lavradores. Quem não conseguisse pagar os impostos ao faraó, em troca de construção de obras de irrigação e armazenamento de cereais, se tornava escravo.
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Convento
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Foi através dos Conventos, que nasceram as prisões
Assim como no Egito, a Grécia, a Pérsia, a Babilônia, o ato de encarcerar, tinha como finalidade conter, manter sob custódia e tortura os que cometiam faltas, ou praticavam o que para a antiga civilização, fosse considerado delito ou crime.
As masmorras também serviam para abrigar presos provisoriamente.
Delitos considerados Crimes:- Estar endividado, não conseguir pagar os impostos, ser desobediente, ser estrangeiro e prisioneiro de guerra.
“Penas” ou Punição:- escravizar, exercer as penas corporais e às infamantes ou executar.
Existia o aprisionamento, mas não como sanção penal, mesmo porque não existia nenhum código de regulamento social.
O ato de aprisionar, não tinha caráter de pena e sim da garantia de manter esta pessoa sob o domínio físico, para se exercer a punição que seria imposta. .
Assim como não existia legalmente uma sanção penal a ser aplicada, e sim punições a serem praticadas, também não existiam cadeias ou presídios.
Os locais que serviam de clausura, eram diversos, desde calabouços, aposentos em ruínas ou insalubres de castelos, torres, conventos abandonados, enfim, toda a edificação que proporcionasse a condição de cativeiro, lugares que preservassem o acusado ou “Réu” até o dia de seu julgamento ou execução.
“Na idade Média”
Da mesma forma, que na antiguidade não se conhecia a pena com privação de liberdade, o mesmo se deu na Idade Média, mantida algumas destas conceitualidades e condutas até à Idade Moderna.
Para aprisionar, não havia necessidade da existência de um local específico. Assim sendo, ainda não se pleiteava uma arquitetura penitenciária própria, pois o cárcere era visto também apenas como local de custódia para manter aqueles que seriam submetidos a castigos corporais e à pena de morte, garantindo, dessa forma, o cumprimento das punições.
Delitos Considerados Crimes:- Blasfêmia, inadimplência, heregias, traição, vadiagem, desobediência.
Penas ou Punição:- Eram submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impunham em função do "status" social a que pertencia o réu. A amputação dos braços, degolar, a forca, incendiar, a roda e a guilhotina, proporcionando o espetáculo e a dor, como por exemplo, a que o condenado era arrastado, seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às pressas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo. Eram essas penas que constituíam o espetáculo favorito das multidões deste período histórico, em alguns casos também se usava como “pena” tornar o “réu” em escravo.
Isso até à Idade Moderna.
A igreja com a criação do Tribunal da Inquisição castigava os hereges com o desterro e a prisão. A principal função desse tribunal era “inquirir” e punir as doutrinas contrárias aos dogmas da Igreja.
“Na Idade Moderna”
Na Idade Moderna, aproximadamente entre os séculos XVI e XVII, a Europa foi atingida de forma extensamente abrangente pela pobreza.
"Para que pudesse surgir à idéia da possibilidade de expiar o delito com um quantum de liberdade, abstratamente predeterminado, era necessário que todas as formas de riqueza fossem reduzidas à forma mais simples e abstrata do trabalho humano medido pelo tempo: portanto, num sistema sócio-econômico como o feudal, a pena-retribuição não estava em condições de encontrar na privação do tempo um equivalente do delito”.
Com o surgimento do capitalismo, constitui-se a pena por excelência do capitalismo industrial. Na sociedade feudal existia a prisão preventiva e a prisão por dívidas.
O alarmante estado de pobreza que se alastrou e afetou diversos Países, contribuíram para o aumento da criminalidade: os distúrbios religiosos, as guerras, as expedições militares, as devastações de países, a extensão dos núcleos urbanos, a crise das formas feudais e da economia agrícola, etc.
Foi então, que se iniciou um movimento de grande transcendência no desenvolvimento das penas privativas de liberdade, na criação e construção de prisões organizadas para a correção dos apenados.
Delitos considerados crimes:- mendigar, vagabundear, tratar com descaso e desobediência a legislação que obrigava a aceitação de qualquer trabalho oferecido, a despeito da remuneração que o acompanhasse.
Em 1893, as prostitutas passaram a serem consideradas como "criminosas natas".
Penas ou Punições:- privação dos bens socialmente considerados como valores: a vida, a integridade física e a perda de status, o equivalente do dano produzido pelo delito. Outras penas: isolamento noturno, a impossibilidade de comunicação entre os detentos, os açoites, o desterro e a execução. Muito embora, diante do aumento da delinqüência, a pena de morte deixou de ser uma solução sensata para aplicá-la como punição.
A partir do Século XVIII as raízes do Direito Penitenciário começaram a formar-se.
Durante muito tempo o condenado foi objeto da Execução Penal e só recentemente é que ocorreu o reconhecimento dos direitos da pessoa humana do condenado
Direito Penitenciário resultou da proteção do condenado. Esses direitos se baseiam na exigência Ética de se respeitar a dignidade do homem como pessoa moral.
Códigos de Leis
O primeiro código foi criado na antiguidade.
Os povos da Mesopotâmia foram às primeiras sociedades que adotaram um código de justiça:- o Código de Hamurabi.
Na verdade, o Código de Hamurabi ou Lei do Talião foi o primeiro código social da Antigüidade, ele se baseava no “olho por olho, dente por dente” tinha base religiosa e moral vingativa.
A Bíblia também contém um código de Lei, O “Tora”, que regulamenta a família, a vida em sociedade, as riquezas e as obrigações. As comunidades judaicas eram centradas no Tora.
Outros códigos da Antigüidade:-
Deuterenômio, Lei de Manu e Lei das XII Tábuas.
Tribunal da Inquisição em 1231, criado pelo Papa Gregório IX.
Na Idade Média
Corpus Juris Civilis, criado pelo imperador Justiniano, restabelecendo a ordem com suas obras: Código, Digesto, Institutas e Novelas.
Código Criminal surgiu em 1830, que estabelecia a “Pena de Prisão”.
No Brasil, com o advento do 1º Código Penal houve a individualização das penas.
Mas somente à partir do 2º Código Penal, em 1890, aboliu-se a pena de morte e foi surgir o regime penitenciário de caráter correcional, com fins de ressocializar e reeducar o detento.
Justiça Federal- Decreto no 510, de 22 de junho de 1890.
Código Penal de 1930: a individualização da execução e o reconhecimento dos direitos subjetivos do condenado.
Em 1937, a Constituição Federal extingue a Justiça Federal de 1ª Instância.
O terceiro Código Penal surgiu em 1940.
Constituição de 1946.
Constituição Federal de 1967
Lei de Execuções Criminais, que é de 11/07/84 e/ou:
Lei de Execuções Penais, no Brasil- 1.984.
Lei dos Crimes Hediondos -Lei 8.072, de 25/07/90.
Lei de Tortura 9.455 é de 1997
Constituição Federal de 1988.
Prisões
A prisão teve sua origem na Igreja.
A detenção se tornou à forma essencial de castigo. O encarceramento passou a ser admitido sob todas as formas. Os trabalhos forçados eram uma forma de encarceramento, sendo seu local ao ar livre. A detenção, a reclusão, o encarceramento correcional não passaram, de certo modo, de nomenclatura diversa de um único e mesmo castigo.
Na Antiguidade, primeira instituição penal, foi o Hospício de San Michel, em Roma, a qual era destinada primeiramente a encarcerar "meninos incorrigíveis", era denominada Casa de Correção.
A primeira Penitenciária Construída no Mundo
A pena de prisão teve sua origem nos mosteiros da Idade Média, "como punição imposta aos monges ou clérigos faltosos, fazendo com que se recolhessem às suas celas para se dedicarem, em silêncio, à meditação e se arrependerem da falta cometida, reconciliando-se com Deus". Essa idéia inspirou a construção da primeira prisão destinada ao recolhimento de criminosos, a House of Correction, construída em Londres entre 1550 e 1552, difundindo-se de modo marcante no Século XVIII.
Porém, a privação da liberdade, como pena, no Direito leigo, iniciou-se na Holanda, a partir do século XVI, quando em 1595 foi construído Rasphuis de Amsterdã.
CORAGEM PARA PENSAR POSITIVO
ORIGEM E EVOLUÇÃO DAS PRISÕES
A prisão é velha como a memória do homem e continua a ser a panacéia penal a que se recorre em todo o mundo. Lê-se no Gênesis (cap. 4 XL): “dois eunucos, o copeiro do rei do Egito e o padeiro, pecaram contra seu senhor. E o Faraó, irado contra eles (porque um presidia aos copeiros, outro aos padeiros), mandou-os meter no cárcere do general do exército, no qual estava também preso José. E o guarda do cárcere entregou-os a José, que também os servia”.
A princípio, a prisão destinava-se a animais. Não se distinguia, porém, entre irracionais e racionais “inferiores”. Prendiam-se homens pelos pés, pelas mãos, pelo pescoço etc., conforme o medo ou a cólera. Homens e animais foram amarrados, acorrentados, calcetados, grilhetados, manietados etc. Das nascentes zoológicas é que vem o uso de “prender”, da canga às algemas. O número crescente de presos foi pretexto para murá-los e ainda emparedá-los, engradá-los, aferrolhá-los, sem prejuízo dos guardas e soldados armados como para a guerra. Cavernas, naturais ou não, subterrâneos, túmulos, fossas, torres, tudo servia para prender. Prendia-se para não deixar fugir ou para obrigar a trabalhar.
Depois, vieram às prisões para “salvar”, “regenerar”, “recuperar”, “corrigir”, “emendar”, “reformar” e outras mentiras. “Vou te emendar”, ouvi, na infância, de pais e mestres de chicote em punho. O chamado sistema ou regime penitenciário, originário de religião, perdeu ou abandonou sua base: o pecador (o criminoso) aceitava e, às vezes, suplicava como graça, a penitência. A “reabilitação” vinha da adesão íntima ao sofrimento purificador. Mais do que anacronismo, prisão constitui, hoje, excrescência sem conteúdo. A penitência é, agora, imposta, aliás, inutilmente, ao sentenciado, quando cabe ao juiz e ao carcereiro, aos mandantes e cúmplices deste. A sinceridade purgatória, a espontaneidade do arrependimento é que tornava “instrumento de vida e de saúde o longo suplício da solidão que, por si mesma, só inspira o vício e o desespero” (Du Boys). Eis o reconhecimento de que, sem a penitência, a penitenciária é vício, é desespero. O sofronistério de PLATÃO era “a casa em que os homens tomavam juízo”. Nas células, tomam loucura. O próprio BENTHAM prejudicou sua visão de precursor com a obsessão da vigilância. E o “sistema panóptico” interrompeu a evolução humanista. CROFTON foi responsável pelo sistema progressivo que não podia progredir além dos esquemas carcerários.
Variaram apenas na “técnica” os castigos diretos ou indiretos, no corpo e na alma. Tudo para confessar e purgar a culpa, arrepender-se e penitenciar-se, sacramentalmente, numa célula. Com finalidade utilitária (proselitismo religioso, trabalho forçado, exploração sob várias formas) a prisão foi sendo ampliada entre muros cada vez mais altos e as segregações, desde o solitary system às progressões e formas mistas de vários tipos, ou a promiscuidade, mais ou menos permanente e completa. Aliás, ainda sob o solitary system, a crônica autenticou a história com a revelação das fraudes para a comunicação e o contato.
Mais tarde, os presos foram soltos nos mais diversos espaços e sob os mais diferentes pretextos. A verdade é que não há, a bem dizer, sistemas ou regimes. Praticamente, influi mais a mudança de um chefe do que um novo Código. E serão possíveis sistemas ou regimes para o assistemático, o irregível, dependente de objeto e meios variáveis, de circunstâncias imprevisíveis? Surgiram até, para uma minoria de privilegiados do mal ou do bem, de um lado, prisões que receberam legendas infernais (e continuam a existir) e, de outro, prisões que se descaracterizam e se desnaturam, até as casas de “boa vida”.
FERRI considerou a prisão celular aberração do século 19, quando é de todos os séculos, inclusive o atual. VOLTAIRE referiu-se às fossas que os bárbaros chamam prisão. Subsiste a fossa-prisão, inclusive para menores. A maioria cumpre penas em lugares mais aberrantes do que as células.
Nenhum país conseguiu resolver, sequer, o problema primário das prisões preventivas ou provisórias, mesmo “especiais”. Estas são agora demoradas e extensivas, mesmo “especiais”. Estas são agora demoradas e extensivas. Condenam-se, desde logo, os indivíduos processados, protegidos pela presunção de inocência, muitas vezes reconhecida pela Justiça, a sofrer tratamento inqualificável. A regra é a masmorra. Não resisto ao impulso da separação fúnebre, porém realista: mas-môrra. Aí está tudo: al-gemas! Mas-môrras! Não bastam gritos passionais, intermitentes e epidérmicos, ora negativos (vingança, alarma e outras excitações e incitações contra o criminoso), ora positivos (piedade e outras excitações a favor do criminoso), em regra com lágrimas esportivas e sustos mimosos de sensitivas vegetais. Ou animais? Uns e outros geraram repercussões cívicas, políticas e até filosóficas. Tenha a ação à ciência!
A vanguarda evoluiu no espaço, do quarto (cela) para a sala, o pátio, o pavilhão, os arredores, a ilha, a colônia. O primeiro avanço fundamental foi à liberdade (a liberdade!) de nova vida noutro lugar. Não importa o nome (transportação, relegação, exílio, degredo, banimento, desterro, expulsão, etc). Quem aprofundar a reflexão há de reconhecer o progresso sobre as penas de morte, castigos corporais, escravidão. A prisão terá sido adiantamento?
Em última análise, que estão pensando e fazendo atualmente? Apesar do unânime reconhecimento da nocividade das penas privativas de liberdade, curtas ou longas, contínuas ou não, determinadas ou não, tudo continua a girar em torno da prisão. No entanto, bastaria abrir, ao acaso, qualquer alfarrábio para encontrar a ciência adquirida há séculos. Vejam, por exemplo, o de WARREE: “a pena é injusta se inútil” E se funesta? São insolúveis os problemas da prisão coma prisão. É o que todos sabem. Mesmo que dispuséssemos de verbas para as separações e as discriminações indispensáveis; ainda desprezando as conquistas técnicas e científicas, não aludo, é claro, a alguns estabelecimentos promocionais “para mostrar” que agravam, com as sombras da iniqüidade, um quadro insustentável pela ignomínia e pela crueldade requintadas pela falsidade e pela hipocrisia.
Privilégios para poucos, pois são poucos os ricos e poderosos presos, enquanto o maior número, até de processados, é animalizado ou explorado nas cadeias. “Penitenciárias maravilhosas” e monumentais, colônias virgilianas são exceções que culminam o contraste com os horrores vizinhos. São ilhas de graças num mar de desgraças. Mas, com outras desgraças – as do estímulo ao mal. Não há mais o que projetar. Os gabinetes estão cheios de planos. Não passam aos atos e fazem ouvidos de mercador – de mercador, sim – aos que têm ciência e, sobretudo, consciência.
http://www.nplyriana.adv.br/link_geral.php?item=geral30&titulo=Orig
A prisão é velha como a memória do homem e continua a ser a panacéia penal a que se recorre em todo o mundo. Lê-se no Gênesis (cap. 4 XL): “dois eunucos, o copeiro do rei do Egito e o padeiro, pecaram contra seu senhor. E o Faraó, irado contra eles (porque um presidia aos copeiros, outro aos padeiros), mandou-os meter no cárcere do general do exército, no qual estava também preso José. E o guarda do cárcere entregou-os a José, que também os servia”.
A princípio, a prisão destinava-se a animais. Não se distinguia, porém, entre irracionais e racionais “inferiores”. Prendiam-se homens pelos pés, pelas mãos, pelo pescoço etc., conforme o medo ou a cólera. Homens e animais foram amarrados, acorrentados, calcetados, grilhetados, manietados etc. Das nascentes zoológicas é que vem o uso de “prender”, da canga às algemas. O número crescente de presos foi pretexto para murá-los e ainda emparedá-los, engradá-los, aferrolhá-los, sem prejuízo dos guardas e soldados armados como para a guerra. Cavernas, naturais ou não, subterrâneos, túmulos, fossas, torres, tudo servia para prender. Prendia-se para não deixar fugir ou para obrigar a trabalhar.
Depois, vieram às prisões para “salvar”, “regenerar”, “recuperar”, “corrigir”, “emendar”, “reformar” e outras mentiras. “Vou te emendar”, ouvi, na infância, de pais e mestres de chicote em punho. O chamado sistema ou regime penitenciário, originário de religião, perdeu ou abandonou sua base: o pecador (o criminoso) aceitava e, às vezes, suplicava como graça, a penitência. A “reabilitação” vinha da adesão íntima ao sofrimento purificador. Mais do que anacronismo, prisão constitui, hoje, excrescência sem conteúdo. A penitência é, agora, imposta, aliás, inutilmente, ao sentenciado, quando cabe ao juiz e ao carcereiro, aos mandantes e cúmplices deste. A sinceridade purgatória, a espontaneidade do arrependimento é que tornava “instrumento de vida e de saúde o longo suplício da solidão que, por si mesma, só inspira o vício e o desespero” (Du Boys). Eis o reconhecimento de que, sem a penitência, a penitenciária é vício, é desespero. O sofronistério de PLATÃO era “a casa em que os homens tomavam juízo”. Nas células, tomam loucura. O próprio BENTHAM prejudicou sua visão de precursor com a obsessão da vigilância. E o “sistema panóptico” interrompeu a evolução humanista. CROFTON foi responsável pelo sistema progressivo que não podia progredir além dos esquemas carcerários.
Variaram apenas na “técnica” os castigos diretos ou indiretos, no corpo e na alma. Tudo para confessar e purgar a culpa, arrepender-se e penitenciar-se, sacramentalmente, numa célula. Com finalidade utilitária (proselitismo religioso, trabalho forçado, exploração sob várias formas) a prisão foi sendo ampliada entre muros cada vez mais altos e as segregações, desde o solitary system às progressões e formas mistas de vários tipos, ou a promiscuidade, mais ou menos permanente e completa. Aliás, ainda sob o solitary system, a crônica autenticou a história com a revelação das fraudes para a comunicação e o contato.
Mais tarde, os presos foram soltos nos mais diversos espaços e sob os mais diferentes pretextos. A verdade é que não há, a bem dizer, sistemas ou regimes. Praticamente, influi mais a mudança de um chefe do que um novo Código. E serão possíveis sistemas ou regimes para o assistemático, o irregível, dependente de objeto e meios variáveis, de circunstâncias imprevisíveis? Surgiram até, para uma minoria de privilegiados do mal ou do bem, de um lado, prisões que receberam legendas infernais (e continuam a existir) e, de outro, prisões que se descaracterizam e se desnaturam, até as casas de “boa vida”.
FERRI considerou a prisão celular aberração do século 19, quando é de todos os séculos, inclusive o atual. VOLTAIRE referiu-se às fossas que os bárbaros chamam prisão. Subsiste a fossa-prisão, inclusive para menores. A maioria cumpre penas em lugares mais aberrantes do que as células.
Nenhum país conseguiu resolver, sequer, o problema primário das prisões preventivas ou provisórias, mesmo “especiais”. Estas são agora demoradas e extensivas, mesmo “especiais”. Estas são agora demoradas e extensivas. Condenam-se, desde logo, os indivíduos processados, protegidos pela presunção de inocência, muitas vezes reconhecida pela Justiça, a sofrer tratamento inqualificável. A regra é a masmorra. Não resisto ao impulso da separação fúnebre, porém realista: mas-môrra. Aí está tudo: al-gemas! Mas-môrras! Não bastam gritos passionais, intermitentes e epidérmicos, ora negativos (vingança, alarma e outras excitações e incitações contra o criminoso), ora positivos (piedade e outras excitações a favor do criminoso), em regra com lágrimas esportivas e sustos mimosos de sensitivas vegetais. Ou animais? Uns e outros geraram repercussões cívicas, políticas e até filosóficas. Tenha a ação à ciência!
A vanguarda evoluiu no espaço, do quarto (cela) para a sala, o pátio, o pavilhão, os arredores, a ilha, a colônia. O primeiro avanço fundamental foi à liberdade (a liberdade!) de nova vida noutro lugar. Não importa o nome (transportação, relegação, exílio, degredo, banimento, desterro, expulsão, etc). Quem aprofundar a reflexão há de reconhecer o progresso sobre as penas de morte, castigos corporais, escravidão. A prisão terá sido adiantamento?
Em última análise, que estão pensando e fazendo atualmente? Apesar do unânime reconhecimento da nocividade das penas privativas de liberdade, curtas ou longas, contínuas ou não, determinadas ou não, tudo continua a girar em torno da prisão. No entanto, bastaria abrir, ao acaso, qualquer alfarrábio para encontrar a ciência adquirida há séculos. Vejam, por exemplo, o de WARREE: “a pena é injusta se inútil” E se funesta? São insolúveis os problemas da prisão coma prisão. É o que todos sabem. Mesmo que dispuséssemos de verbas para as separações e as discriminações indispensáveis; ainda desprezando as conquistas técnicas e científicas, não aludo, é claro, a alguns estabelecimentos promocionais “para mostrar” que agravam, com as sombras da iniqüidade, um quadro insustentável pela ignomínia e pela crueldade requintadas pela falsidade e pela hipocrisia.
Privilégios para poucos, pois são poucos os ricos e poderosos presos, enquanto o maior número, até de processados, é animalizado ou explorado nas cadeias. “Penitenciárias maravilhosas” e monumentais, colônias virgilianas são exceções que culminam o contraste com os horrores vizinhos. São ilhas de graças num mar de desgraças. Mas, com outras desgraças – as do estímulo ao mal. Não há mais o que projetar. Os gabinetes estão cheios de planos. Não passam aos atos e fazem ouvidos de mercador – de mercador, sim – aos que têm ciência e, sobretudo, consciência.
http://www.nplyriana.adv.br/link_geral.php?item=geral30&titulo=Orig
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